Meditações sobre a oração para um retiro pessoal ou em grupo

1ª MEDITAÇÃO: NECESSIDADE DA ORAÇÃO E DE MÉTODO
Os autores que escrevem sobre a espiritualidade descrevem três tipos de oração: oral, mental e mística (1) . Estas se completam e cada uma sublinha um aspecto importante da oração: ela é um diálogo; é uma elevação da mente a Deus e é também uma elevação do coração ao Senhor (2).
A oração é um diálogo com Deus, mas não no sentido mágico ou supersticioso em que determinadas palavras têm mais poder que outras, ou têm poder em si mesmas; tratase antes de dirigir-se ao totalmente Outro que, no entanto, nos ama e quer estar próximo de nós, é nosso Pai e quer nos escutar. Ela é também uma elevação da mente, mas não no sentido gnóstico em que o conhecimento é que salva, ou no sentido dos filósofos antigos que concebiam a filosofia – entendida como estilo de vida que privilegia o pensar e o contemplar – como caminho de felicidade, mas no sentido evangélico em que também os pobres e humildes têm acesso ao mistério do Reino (cf. Mt 11,25 e 1Cor 1,19ss) e os puros de coração verão a Deus (cf. Mt 5,8).
A oração é elevação do coração, pois implica amor, afeto do coração, de modo que obedecer ao Senhor e praticar a caridade são consequências do amor para com Ele.
A oração da Igreja é sempre dirigida ao Pai pelo Filho no Espírito. No Filho Jesus, somos feitos filhos de Deus (Jo 1, 11-12; Gl 4, 4-6). Jesus nos introduziu na sua filiação, agora somos filhos no Filho. Neste sentido participamos também do relacionamento de Jesus com o Pai (cf. Jo 17, 23-26) e da vida divina de Deus (cf. 2Pd 1,4). O Espírito é a prova de que somos filhos (cf. Rm 8,14-17). Quando oramos, sendo membros do Corpo (cf. Rm 12,5; Ef, 5, 29-30; Cl 1,18), participamos da oração perene de Cristo ao Pai.
A necessidade da oração é atestada diversas vezes por Jesus nos evangelhos e também pelos apóstolos em suas epístolas, bastaria citar alguns exemplos: Mt 6,9; 26,41; Lc 18,1; 21,36; Ef 6,18; 1Ts 5,17; Tg, 5,16.
A oração conduz à caridade e nos fortalece para praticar as boas obras, e as boas obras, por sua vez, tendo origem em Deus, são também uma forma de oração. Entretanto, não podemos transformar o trabalho numa espécie de ídolo no qual pomos nossa confiança, afastando-nos de Deus, por isso mesmo a oração como diálogo, elevação da mente e do coração a Deus, nos mantém unidos ao Senhor como nosso centro e referência vital, evita a dispersão e nos faz crescer na caridade
Frei Patrício Schiadini, padre carmelita, insiste na necessidade de método para a vida de oração. Ele lembra que quando alguém tem um propósito ou uma meta, tem também necessidade de um caminho para chegar lá. Ainda que seja simples o método, ele é importante, sobretudo no início da vida espiritual. Com o passar do tempo a pessoa vai adquirindo sua própria maneira de orar e vai se tornando mais espontânea e mais livre (3).
Texto para meditação pessoal: Lc 18, 1-8: oração perseverante. Perguntar-se: “Como estou cuidando da vida de oração?”.
Ler também o texto abaixo, cuja fonte é: http://www.liturgiadashoras.org/ acessado em 15/03/2012
Do Tratado sobre a oração, de Tertuliano, presbítero (Cap.28-29: CCL 1,273-274)
(Séc. III)
O sacrifício espiritual
A oração é o sacrifício espiritual que aboliu os antigos sacrifícios. Que me importa a
abundância de vossos sacrifícios? – diz o Senhor. Estou farto de holocaustos de
carneiros e de gordura de animais cevados; do sangue de touros, de cordeiros e de
bodes, não me agrado. Quem vos pediu estas coisas? (Is 1,11).
O Evangelho nos ensina o que pede o Senhor: Está chegando a hora, diz ele, em que os
verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e verdade. Deus é espírito (Jo
4,23.24), e por isso procura tais adoradores. Nós somos verdadeiros adoradores e
verdadeiros sacerdotes, quando, orando em espírito, oferecemos o sacrifício espiritual
da oração, como oferenda digna e agradável a Deus, aquela que ele mesmo pediu e
preparou.
Esta oferenda, apresentada de coração sincero, alimentada pela fé, preparada pela
verdade, íntegra e inocente, casta e sem mancha, coroada pelo amor, é a que devemos
levar ao altar de Deus, acompanhada pelo solene cortejo das boas obras, entre salmos e
hinos; ela nos alcançará de Deus tudo o que pedimos
Que poderia Deus negar à oração que procede do espírito e da verdade, se foi ele
mesmo que assim exigiu? Todos nós lemos, ouvimos e acreditamos como são grandes
os testemunhos da sua eficácia! Nos tempos passados, a oração livrava do fogo, das
feras e da fome; e no entanto ainda não havia recebido de Cristo toda a sua eficácia.
Quanto maior não será, portanto, a eficácia da oração cristã! Talvez não faça descer
sobre as chamas o orvalho do Anjo, não feche a boca dos leões, não leve a refeição aos
camponeses famintos, não impeça milagrosamente o sofrimento; mas vem em auxílio
dos que suportam a dor com paciência, aumenta a graça aos que sofrem com fortaleza,
para que vejam com os olhos da fé a recompensa do Senhor, reservada aos que sofrem
pelo nome de Deus.
Outrora a oração fazia vir as pragas, derrotava os exércitos inimigos, impedia a chuva
necessária. Agora, porém, a oração autêntica afasta a ira de Deus, vela pelo bem dos
inimigos e roga pelos perseguidores. Será para admirar que faça cair do céu as águas, se
conseguiu que de lá descessem as línguas de fogo? Só a oração vence a Deus. Mas Cristo
não quis que ela servisse para fazer mal algum; quis antes que toda a eficácia que lhe
deu fosse apenas para servir o bem. Consequentemente, ela não tem outra finalidade
senão tirar do caminho da morte as almas dos defuntos, robustecer os fracos, curar os
enfermos, libertar os possessos, abrir as portas das prisões, romper os grilhões dos
inocentes. Ela perdoa os pecados, afasta as tentações, faz cessar as perseguições,
reconforta os de ânimo abatido, enche de alegria os generosos, conduz os peregrinos,
acalma as tempestades, detém os ladrões, dá alimento aos pobres, ensina os ricos,
levanta os que caíram, sustenta os que vacilam, confirma os que estão de pé.
Oram todos os anjos, ora toda criatura. Oram à sua maneira os animais domésticos e as
feras, que dobramos joelhos. Saindo de seus estábulos ou de suas tocas, levantam os
olhos para o céu e não abrem a boca em vão, fazendo vibrar o ar com seus gritos.
Mesmo as aves quando levantam voo, elevam-se para o céu e, em lugar de mãos,
estendem as asas em forma de cruz, dizendo algo semelhante a uma prece.
Que dizer ainda a respeito da oração? O próprio Senhor também orou; a ele honra e
poder pelos séculos dos séculos.
2ª MEDITAÇÃO: DIFICULDADES NA VIDA DE ORAÇÃO E SUPERAÇÃO
A vida de oração exige método e perseverança. Para se desenvolver a vida interior há a necessidade de dedicação e de aprender a lidar com as dificuldades que surgem ao longo do caminho.
SENTIR A PRESENÇA DE DEUS
Uma das dificuldades muito citadas na vida de oração é o fato de não se sentir a presença de Deus ou não ter alguma moção do afeto, algo no âmbito da emoção. Aqui é preciso recordar que quando falamos de oração, falamos de diálogo com Deus, um Deus vivo e presente, mas que é sempre mistério. É preciso recordar que caminhamos pela fé e não pela visão. É na fé, portanto, que devemos superar tal dificuldade, isto é, confiarmos e entregarmo-nos a Ele e aguardarmos de sua liberalidade as moções que Ele pode despertar em nós. Assim se expressa Frei Patrício: “É pela fé, alicerce de toda nossa vida, que o diálogo com o Senhor assume o caminho da transcendência e se faz vida e razão do nosso viver. O silêncio de Deus é duro de suportar. Só depois de assumi-lo, torna-se solidão sonora e música silenciosa que encanta e enamora a alma” (4). Além disso, é preciso evitar alguns erros, tais como as concepções errôneas sobre a oração, as mentalidades mundanas sobre ela e nossos fracassos em relação à mesma (CIC 2726-2728).
AS DISTRAÇÕES
Outra queixa muito frequente diz respeito às distrações na oração (5). A distração é a mudança de foco do pensamento. De fato, nossa mente dificilmente concentra-se por longo tempo num só ponto ou numa só direção. As distrações podem ocorrer com todos. Há distrações que podem atrapalhar a oração. Nós podemos classificá-las em dois tipos: voluntárias e involuntárias. Como o próprio nome diz, as voluntárias são aquelas permitidas por nós e que para serem superadas exigem vigilância e disciplina. Já as involuntárias não dependem de nós, temos de aprender a conviver com elas de modo a não fazer disto um drama. O remédio é retomar sempre a atenção e o foco. Para ambos os tipos é bom lembrar que devemos evitar tudo quanto pode esfriar nosso coração (ver também CIC 2729-2730).
A ARIDEZ ESPIRITUAL
A aridez (6) também é uma dificuldade que se apresenta a muitos (CIC 2731). Aridez é aquela sensação de que a oração não nos está abastecendo, não nos está fazendo sentir a presença do Senhor. A oração torna-se, às vezes, difícil, trabalhosa e cansativa. Muitos santos experimentaram a aridez, como, por exemplo, Santa Tereza D’Ávila, que passou 18 anos nesta situação. As causas da aridez podem ser: falta de zelo, falta de vigilância e generosidade na vida espiritual, entre outras. Daí a necessidade da revisão de vida. Há motivos mais frequentes para a aridez, tais como: “cansaço físico, sonolência, indisposições orgânicas, preocupações, angústias, problemas pessoais e familiares, pequenos desentendimentos e incompreensões na vida comunitária, no apostolado, na família, ou outras situações concretas que colocam nosso espírito em dificuldade de pensar, rezar, refletir” (7). Para superar ou suportar a aridez é necessário exercitar a paciência, abandonando-nos nas mãos de Deus e esperando em sua compaixão, isto acompanhado da perseverança na fidelidade. A aridez pode também ser uma provação que Deus nos impõe, uma ação divina purificadora para nós. O remédio para a aridez está na fidelidade à oração e confiança no amor de Deus. Às vezes é preciso não violentar o coração forçando a meditação, pois não se deve exagerar na insistência. Em muitos casos o melhor é manter-se na presença do Senhor por meio da repetição de frases curtas da Escritura ou jaculatórias que nos ajudem a manter o espírito na direção certa e a chama da fé, esperança e caridade acesa no coração. Em tudo buscar a vontade de Deus, pois ao passar a aridez e a purificação, nos trará paz e tranquilidade. Como, às vezes, é difícil discernir as causas da aridez – se vem de Deus ou se é causada por nossas infidelidades – o melhor é sempre perseverar na oração, mesmo que seja um sacrifício para nós, bem como a frequência aos sacramentos. Além disso, a direção espiritual é fundamental e nos ajuda a manter a paz
A TENTAÇÃO DA FALTA DE FÉ
A falta de fé como opção livre, a qual coloca Deus em segundo plano é, sem dúvida, obstáculo para uma vida de oração frutífera. Assim se exprime o Catecismo da Igreja no n. 2732: “A tentação mais comum, mais oculta, é nossa falta de fé, que se exprime não tanto por uma incredulidade declarada quanto por uma opção de fato. Quando começamos a orar, mil trabalhos ou cuidados, julgados urgentes, apresentam-se como prioritários; de novo, é o momento da verdade do coração e de seu amor preferencial. Com efeito, voltamo-nos para o Senhor como o último recurso: mas de fato acreditamos nisso? Às vezes tomamos o Senhor como aliado, mas o coração ainda está na presunção. Em todos os casos, nossa falta de fé revela que não estamos ainda na disposição do coração humilde: "Sem mim, nada podeis fazer" (Jo 15,5)”.
A ACÍDIA
A acídia é outra dificuldade. Ela é fruto da negligência e presunção, pois às
vezes a pessoa julga que pode tudo sozinha e despreza a graça (CIC 2733). Isto pode
levar a uma espécie de apatia em relação à vida espiritual. A acídia foi muito
bem descrita pelos Padres do Deserto, cuja espiritualidade consistia em buscar o
deserto para uma experiência mais profunda de Deus, a qual levava-lhes
necessariamente a um conhecimento mais profundo de si mesmos e das paixões
humanas. A acídia é a tentação provocada pelo que eles chamam de “demônio do meiodia”.
É um tipo de tentação que não ataca apenas parte da alma, mas ela toda
sufocando o intelecto e tirando toda a energia da pessoa, a qual entra numa espécie de
letargia ou estado depressivo. Por isso mesmo a acídia traz consigo sintomas
como medo no coração e angústia interior, estado que levava o monge a
refugiar-se no sono ou numa atividade frenética. São Gregório Magno citava
como consequências da acídia: “a desesperação, o desencorajamento, o mau humor, a
amargura, a indiferença, a sonolência, o enfado, a fuga de si, a curiosidade, o perder-se
nas fofocas, a inquietude do espírito e do corpo, a inconstância, a pressa e a
volubilidade (8). Diante de uma tal situação “Os monges aconselham a resistir, para
que depois surja nova vida, paz, alegria”
(9)
Segundo Galilea afirma que o deserto, vivenciado pelos Padres como parte do espírito
humano, como atitude espiritual e como lugar e ambiente externo (10), leva o monge a
fazer também a experiência do deserto como lugar da tentação e da crise, bem como de
sua superação:
“Com efeito, o deserto como momento forte da espiritualidade é sempre uma
crise. Nele encontramos Deus, mas também o demônio. A miséria de que
somos feitos emerge aí como verdade, como desânimo, mesmo como
desespero. Ou nos entregamos a Deus, ou nos fechamos em nós mesmos,
fugindo de Deus: nisso consiste a tentação. Estas duas alternativas são
radicais e incompatíveis, e a gravidade da crise persiste até que morramos à
nossa imagem e a ‘fazermos nossa vida’, e acolhemos Deus. A graça do
deserto é vencer a tentação sutil que o demônio nos apresenta como um bem
aparente: a procura de segurança e santidade em nós mesmos” (11)
.
.
A SENSAÇÃO DE NÃO SER ATENDIDO
Outra dificuldade relatada é o fato de não ser atendido na oração. De fato muitas pessoas se queixam de não ter obtido o que pediram. O Catecismo (n. 2735-2737) faznos grandes questionamentos: nós nos perguntamos se nossa oração é agradável ao Senhor? Nós vemos Deus como nosso Pai ou como meio para obter o que julgamos necessário? Aqui há um desafio para a nossa fé: crer que Deus dispõe-nos sempre o melhor, confiar na ação do Espírito que nos ajuda a orar como convém (Rm 8,26) e pedir a graça para rezar bem (Tg 4,2-3), com um coração indiviso e confiante, resgatando a gratuidade do amor (12) .
Textos para meditação pessoal: Mc 11, 22-26: Orar e perdoar.
Perguntar-se: quais são as minhas maiores dificuldades na oração? Em que esta reflexão está me ajudando? Que atitude vou tomar para melhorar?
Ler também: A ORAÇÃO DE LOUVOR [Fonte: http://www.news.va/pt/news/comoo-incenso-que-queima-16-de-outubro-de-2014 (acessado em 16/11/2014)].
MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA PELO PAPA FRANCISCO NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE - Quinta-feira, 16 de Outubro de 2014
Consciente de ter sido escolhido pessoalmente, ainda antes da criação do mundo, cada homem deve redescobrir a importância da prece de louvor a Deus, gratuita e jubilosa. O Papa quis meditar sobre a primeira leitura da liturgia, que cita o célebre hino paulino de bênção, no início da Carta aos Efésios (1, 1-10). Uma autêntica explosão de louvor: «parece que Paulo — comentou — entre numa grande alegria
É um cântico que «não pode cessar» e no qual o apóstolo usa três vezes o termo «bendito»: «Bendito seja Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que do alto do céu nos abençoou com todos os dons espirituais em Cristo». Mas, observou Francisco, «todos nós sabemos que Deus é o Bendito»: no Antigo Testamento, «era um dos nomes que o povo de Israel lhe atribuía: o Bendito». É estranho pensar em «bendizer a Deus», dado que «Ele é o Bendito
Na realidade, trata-se de um gesto importante, pois «quando bendigo a Deus, digo bem dele e ajo como o incenso que queima». A prece de louvor é uma oração que «habitualmente nós não recitamos»; e no entanto, frisou o Papa, foi o próprio Jesus que nos ensinou «no Pai-Nosso a rezar assim: Pai nosso, que estais nos céus, santificado seja o vosso nome...». E não deve parecer estranho dirigir-nos com tais palavras Àquele que «é o Santo». Trata-se de manifestar a «alegria da prece de louvor», «pura gratuidade». Em geral, «sabemos orar muito bem quando pedimos» e também «quando agradecemos ao Senhor»; para todos nós é menos habitual «louvar o Senhor
O impulso para este tipo de prece pode ser maior «se recordarmos o que o Senhor fez na nossa vida», a exemplo de são Paulo, que no seu hino recorda: Em Cristo, Ele escolheu-nos antes da criação do mundo». Eis a fonte da nossa oração: Bendito sois Vós, Senhor, porque me escolhestes!. Ou seja, o homem deve sentir a «alegria de uma proximidade paternal e terna
Aconteceu a mesma coisa com o povo de Israel, quando foi libertado da Babilónia, recordou o Papa citando alguns versículos do Salmo 126 e observando: «Pensemos num grande sorriso, assim é a prece de louvor!, é a expressão imediata de uma alegria imensa, de se sentir feliz diante do Senhor. É uma disposição do coração que não podemos esquecer: «Procuremos recuperá-la» exortou, convidando a repetir as palavras do Salmo 97.
É muito importante fazer memória, recordar o que o Senhor fez a favor de cada um de nós, com quanta ternura me acompanhou, como se humilhou e se inclinou!, como o pai se debruça sobre o filho para o ensinar a caminhar. E, frisou o Papa, fê- lo com cada um de nós!
Mesmo que «não se possa compreender nem imaginar: que o Senhor me tenha conhecido antes da criação do mundo, que o meu nome estava no Coração do Senhor. Mas esta é a verdade, a revelação». E se não crermos nisto, não somos cristãos, talvez impregnados de religiosidade teísta, mas não cristãos, pois a característica do cristão é o facto de ser escolhido.
O pensamento de habitar sempre no Coração de Deus «enche-nos de alegria» e «dá- nos segurança», como confirmam as palavras do Senhor ao profeta Isaías, que se interrogava se tal predilecção pudesse faltar: «Pode uma mãe esquecer-se do seu filho? E ainda que a mãe o fizesse, eu não me esqueço de ti!».
Esta verdade é tão grande e excelsa que podemos ter a tentação de não pensar nela, de a evitar porque nos domina. Para a fazer nossa e vivê-la, «devemos entrar no mistério de Jesus Cristo
Daqui deriva a terceira atitude fundamental do cristão, depois do louvar e do saber fazer memória. O cristão é chamado «a entrar no mistério», sobretudo quando «celebramos a Eucaristia, pois não é possível entender totalmente que o Senhor está vivo, está connosco aqui, na sua glória e plenitude, enquanto oferece novamente a sua vida por nós. Trata-se de uma atitude que devemos «aprender cada dia», porque o mistério não se pode controlar. É preciso entrar nele!
3ª MEDITAÇÃO: PERSEVERANÇA E CRESCIMENTO NA VIDA DE ORAÇÃO.
O apóstolo Paulo, seguindo os passos de Jesus, nosso Mestre da Oração, exorta: “Orai sem cessar” (1Ts 5,17). Orar assim é perseverar no amor, pois sem amor não há oração. Trata-se de saber “unir a oração à vida, às obras, onde não há rupturas entre o coração e a vida. Fé-vida-obras são uma única realidade” (13) .
Ao rezar, devemos nos entreter com o Senhor, pedir a Ele para que nosso amor por Ele e pelos irmãos cresça, mergulhar no seu Mistério de Amor, “Porque não é o muito saber que sacia e satisfaz a alma, mas o sentir e saborear as coisas internamente” com o auxílio do Espírito Santo (Cf. Santo Inácio de Loyola, Exercícios Espirituais, São Paulo: Loyola 1990, n. 02, 2ª anotação, p. 12).
Supliquemos ao Espírito Santo a graça da oração e da comunhão de amor com o Senhor e procuremos corresponder a esta graça.
Para meditar: Tg 5, 16-20: a força da oração do justo
Ler também: A ORAÇÃO DE INTERCESSÃO (Evangelii Gaudium 281-283– Papa Francisco)
A força missionária da intercessão
281. Há uma forma de oração que nos incentiva particularmente a gastarmo-nos na evangelização e nos motiva a procurar o bem dos outros: é a intercessão. Fixemos, por momentos, o íntimo dum grande evangelizador como São Paulo, para perceber como era a sua oração. Esta estava repleta de seres humanos: «Em todas as minhas orações, sempre peço com alegria por todos vós (...), pois tenho-vos no coração (Fl 1, 4.7). Descobrimos, assim, que interceder não nos afasta da verdadeira contemplação, porque a contemplação que deixa de fora os outros é uma farsa.
282. Esta atitude transforma-se também num agradecimento a Deus pelos outros. Antes de mais, dou graças ao meu Deus por todos vós, por meio de Jesus Cristo (Rm 1, 8). Trata-se de um agradecimento constante: «Dou incessantemente graças ao meu Deus por vós, pela graça de Deus que vos foi concedida em Cristo Jesus» (1 Cor 1, 4); «todas as vezes que me lembro de vós, dou graças ao meu Deus» (Fl 1, 3). Não é um olhar incrédulo, negativo e sem esperança, mas uma visão espiritual, de fé profunda, que reconhece aquilo que o próprio Deus faz neles. E, simultaneamente, é a gratidão que brota de um coração verdadeiramente solícito pelos outros. Deste modo, quando um evangelizador sai da oração, o seu coração tornou-se mais generoso, libertou-se da consciência isolada e está ansioso por fazer o bem e partilhar a vida com os outros.
283. Os grandes homens e mulheres de Deus foram grandes intercessores. A intercessão é como a «levedação» no seio da Santíssima Trindade. É penetrarmos no Pai e descobrirmos novas dimensões que iluminam as situações concretas e as mudam. Poderíamos dizer que o coração de Deus se deixa comover pela intercessão, mas na realidade Ele sempre nos antecipa, pelo que, com a nossa intercessão, apenas possibilitamos que o seu poder, o seu amor e a sua lealdade se manifestem mais claramente no povo.
Espero que tais meditações possam ajuda-los(as) a crescer na comunhão com Deus e, consequentemente, na comunhão com os irmãos e também para uma vivência mais profunda da Quaresma, a qual nos propõe a oração como um dos exercícios espirituais importantes para a caminhada do discípulo missionário de Jesus, ao lado da esmola (caridade fraterna e solidariedade com o próximo) e o jejum (o despojar-se para vencer os apegos às coisas que passam e se dispor para a graça e para as coisas que não passam).
Deus os abençoe e lhes dê uma santa e feliz Páscoa da Ressurreição!
Pe. Edilson de Souza Silva.
Pároco.
NOTAS:
(1) Cf. Tomáš ŠPIDLÍK. Manuale Fondamentale di Spiritualità. Casale Monferrato (AL): Piemme Theologica 1997, p. 368.
(2) Cf. ŠPIDLÍK, p. 369.
(3) Cf. Frei Patrício SCHIADINI. Catecismo da Oração. São Paulo: Loyola 1996, p. 80-82.
(4) SCHIADINI, p. 122.
(5) Cf. SCHIADINI, p. 125-128.
(6) Cf. SCHIADINI, p. 130-135.
(7) SCHIADINI, p. 133.
(8) GRÜN, Anselm. Per vincere il male: la lotta contra i demoni. Cinisello Balsamo (Milano): San Paolo 2003, p. 47.
(9) GRÜN, p. 49.
(10) Cf. Segundo GALILEA. A Sabedoria do Deserto: atualidade dos Padres do deserto na espiritualidade contemporânea. São Paulo: Paulinas 1986, p. 45.
(11) GALILEA, p. 50.
(12) Cf. Frei Patrício SCHIADINI. Catecismo da Oração. São Paulo: Loyola 1996, p. 140.
(13) Cf. SCHIADINI, p. 141.